segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Abutres, Tarzan, Jane, Sandokan e a Santa Iria...

Este vai ser tipo 2 em 1. Passo a explicar, duas provas um texto... Ok? Não interessa a resposta que queiras dar... vai mesmo ser assim, não é opcional :)


Fui ao Trail dos Abutres, nunca lá tinha ido e depois de muito ouvir falar, inscrevi-me na distância dos 47 km. Insanidade mental, só pode... :-)


Como nestas coisas mais vale acompanhado do que só, o carro saiu de Albergaria-a-Velha cheio de atletas, alguns para os 23' mas a maioria para os 47 km. O dia acordou bonito, frio mas sem sinais de chuva, o que para esta altura do ano é uma raridade. Levantado os dorsais, preparei-me e dirigi-me para a fila do controlo zero. Tudo bem organizado e afinado, rapidamente passei está fase. Dois dedos de conversa com os amigos antes da partida, alguma ansiedade presente entre todos aqueles aventureiros, o tiro de partida é dado, tempo para os últimos "boa sorte" e lancei-me de forma muito prudente para esta aventura.

Os primeiros km foram super simpáticos, por dentro de um parque, onde podíamos avistar uns linces, ovelhas e penso que veados. Com toda está distração rapidamente aproximei-me do primeiro posto de abastecimento e a viagem prosseguiu.

As facilidades a partir daqui acabaram, entramos na selva e: lama e mais lama, árvores, baixa cabeça, lama, árvores....passa rio, sobe, desce, cai, bate cu, sobe, desce, baixa a cabeça, passa na lama, passa no rio, vê cascata, escala pedra, sobe, desce, salta, lama, passa rio, escorrega, bate cu, ajuda amigo, és ajudado, escorregas, conversas, dizes mal da tua vida, cais, bate cu, escala pedra, desce descontroladamente e só paras na árvores.... Cansado de ler? Imagina quem la estava a caminhar. Sim, caminhar!!!! Porque "de correr" este trail pouco ou nada tem. Confesso que não ia preparado para algo deste género, já fiz alguns trails, uns mais duros que outros, mas todos têm uma característica, há possibilidade de intercalar a corrida com a caminhada. Neste nunca tive essa sensação, das poucas vezes que podia ter corrido, ia tão cansado quem nem forças tinha para tal... Heheheh

Foi durante esta minha caminhada, pela Selva da Serra da Lousã, que tenho a certeza que vi o Tarzan e a Jane a rirem-se de mim,  numa atitude de vingança,contemplação e cobrança, pelos bons momentos que eu passei a ver este herói na televisão (a preto e branco) sentado no sofá, enquanto ele se desenvencilhava de todos os problemas que lhe iam surgindo na selva.

Vi também o Sandokan, personagem lutadora e que sempre se safou de vários stress que lhe foram surgindo, com a sua espada fabulosa. Ainda lhe pedi a espada emprestada, mas dele só obtive um piscar de olhos e um sorriso matreiro.

Não tenho a certeza  mas penso que também estava lá, escondido por entre as árvores e rochas, o Mogli, aquele menino que fez/faz as delícias da criançada e que se viu aflito para sobreviver na selva, junto dos gorilas.

Agora dou-lhes valor... A selva é mesmo dura e de romântica nada tem :-)

Sei que estão a pensar que eu vejo coisas esquisitas... Mas sou assim, imaginação fértil ou alucinações, uma delas será :-)

Finalizei esta minha aventura aos 30 km, com 5h15' de prova... A dureza da prova tirou-me todo o prazer de a fazer; esta sensação obrigou-me a ponderar  e decidi ficar por lá. Se fiz bem? Não sei... Mas naquele momento foi a decisão que me pareceu mais certa... :-)

Para me redimir do meu pecado (desistir), decidi participar no trail de Sta. Iria, nada como correr para uma santa nos momentos delicados, típico de português.

No ano passado participei neste trail, tinham sido 25 km de puro gozo mas este ano o desafio tinha mais 10 km e umas quantas subidas a mais.

Aproveitei que um amigo de Albergaria também ia, o Vidal, e juntei-me a ele na viagem. Fomos conversando sobre os nossos treinos, provas e expectativas e dessa forma rapidamente chegamos ao destino.

Levantar os dorsais, conversa com uns e outros e o tempo foi passando. Este trail tinha algo de especial, o meu irmão Zé e a minha irmã Tina iam estriar-se nos trails, fazendo o mini trail de 13 km (que no final foram 16 km). Apesar de eu ser o mais novo dos irmãos, sou o mais experiente nestas andanças, por isso aproveitei para lhes dar uns breves conselhos e prepará-los para o que iam encontrar, se é que isso é possível. A prova deles correu-lhes bem, pelos vistos praguejaram um pouco nas subidas íngremes e nas descidas técnicas, mas no final já me estavam a perguntar onde seria o próximo para poderem participar. :-).

Mas voltando ao meu trail, a hora da partida chegou rapidamente e foi dada com apenas 5 min de atraso. O pessoal anda muito hiperativo nas partidas, arranca tudo à morte e eu lá me tentei enquadrar neste panorama de hiperatividade. Fui galgando os primeiros km, com ótimas sensações. Rapidamente passei no primeiro abastecimento, peguei numa banana e prossegui. Mais um pouco de kms a rolar e pimba a primeira dificuldade, que subida! Daquelas feitas tipo cão!!! A 4 patas... Com a agravante de ser longa. Neste tipo de subidas perco sempre algum tempo, pois a minha capacidade de caminhar não é muita. Pelo mau aspeto daquela subida e pelo grau de dificuldade, deduzi que era a tal subida de nome «impossível».

Chegado lá cima, lá me lancei novamente a papar kms, mas a partir daqui foram dificuldades atrás de dificuldades. Muita pedra, muita subida, muita descida... pedra e mais pedra escorregadia, mas sempre intercalado com espaços para correr e aliviar as pernas. Gosto quando assim é.... :)





A chuva foi ameaçando, mas nunca apareceu, o que facilitou a tarefa a todos os atletas...:)


Ao km 28, enganei-me; ia tão concentrado a curtir a música e o percurso, que não reparei numa cortada à direita e segui em frente. Comecei a achar estranho não aparecerem fitas e resolvi voltar para trás. O engano deve ter sido de cerca de 1 km, o suficiente para perder uns 5 a 6 minutos com aquilo. Mas nestas coisas há males que vêm por bem, pois com este engano, fui apanhado pelo meu colega de equipa Pedro Fernandes. Confesso que uma boa companhia nesta fase, foi que nem ginjas. As forças já vinham justas e ter alguém com quem partilhar o empeno foi do melhor. Desta forma, confesso que os 10 km finais passaram bem mais rápidos, com algumas lamentações do empeno trazido de parte a parte, mas em qualquer dos casos uma grande satisfação por sentirmos que iamos ultrapassar mais um objetivo.

A meta começou a aproximar-se muito rapidamente, a música da chegada já se ouvia e isso trouxe-nos uma força adicional. Lá fomos galgando as últimas lamas e águas surgidas, a última subida também foi passada em corrida... e finalmente a meta.... TOP. Um cortar a meta com o amigo Pedro Fernandes e ter à espera o

meu grande amigo Tiago Aragão, foi ouro sobre azul.


Confesso que depois de ter desistido nos Abutres, estava a precisar de ter estas sensações: divertir-me e acabar a prova :).

Agora venha a próxima, que vai ser a Ultra do Sicó. Vão ser 50 km que servirão essencialmente para preparar os 100 km do Ultra Trail de S. Mamede. A partir desta fase toda a minha preparação está direcionada para este grande objetivo.

Amigas e amigos bons treinos e boas leituras....